8 de fevereiro de 2019 in ArtigosSustentabilidade

Brumadinho: lições que precisam ser aprendidas

Sexta-feira, 8 de fevereiro. A pausa do horário do almoço na cidade mineira em que todos se conhecem parece já durar duas semanas. Desde que a barragem da Vale se rompeu, Brumadinho vive a dor, o luto e a falta de respostas de uma tragédia que não parece ter fim. 

Vista aérea da região afetada pelo rompimento da barragem da mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG) – 26/01/2019 (Andre Penner/AP)

Até a noite de quinta-feira (7), 158 mortes haviam sido confirmadas e 182 pessoas seguiam desaparecidas. O Rio Paraopeba e toda a sua biodiversidade também encontram-se comprometidos desde o rompimento, em 25 de janeiro, de barragem da mina Córrego do Feijão. Ao todo foram liberados no meio ambiente quase 13 milhões de metros cúbicos de lama, que ceifaram a vida de centenas de pessoas e animais, destruíram moradias e causaram danos ambientais de difícil reparação.

A doutora em Direito Ambiental Erika Bechara observa, no artigo “O direito ambiental pode ajudar a evitar e a lidar com tragédias como as de Brumadinho e Mariana?”,  que quando ocorre uma tragédia dessa proporção, a reação imediata da sociedade é pedir o endurecimento das leis e a punição dos responsáveis (além, é claro, do salvamento das vítimas, sempre em primeiro plano). “Nada contra a mudança de lei com vistas ao agravamento das sanções (caso as existentes sejam insuficientes) muito menos contra a punição dos responsáveis com prisão e pesadas multas. Mas se, diante de eventos como esses, não enfatizarmos a importância da prevenção, novos desastres ocorrerão. E mais vítimas agonizarão, mais recursos ambientais serão destruídos e a punição exemplar dos responsáveis não trará de volta as vidas e o equilíbrio ecológico perdidos”, alerta a especialista.

Bechara lembra que, no Brasil, há mais de 24 mil barragens para as mais diversas finalidades (irrigação, hidrelétrica, abastecimento de água etc.) e, desse montante, 790 barragens de resíduos de mineração, como as de Mariana e Brumadinho, algumas das quais com categoria de risco alta. E fiscalização baixa. “Por isso é que a prevenção é um dos mais importantes princípios ambientais. Partindo da premissa de que o equilíbrio ambiental é essencial para a sadia qualidade de vida (que engloba saúde, segurança, bem-estar físico e psíquico) e que os danos ambientais são, via de regra, irreversíveis ou de difícil, demorada e custosa reparação, o princípio em apreço defende que sejam adotadas todas as medidas possíveis para se evitar a degradação, para impedir que o risco de dano se torne um dano concreto”, defende.

Medidas

Entre os instrumentos e medidas previstos na legislação em vigor que, se bem utilizados, podem prevenir acidentes com barragens, a especialista destaca:

  • Licenciamento ambiental (que autoriza a implantação e operação da barragem mediante a adoção de tecnologias de ponta para controle dos riscos ambientais, de protocolos de segurança e planos de emergência, tudo às expensas do empreendedor);
  • Monitoramento (acompanhamento da barragem, pelo empreendedor, em todas as fases de desenvolvimento – da construção à desativação e descomissionamento –  para avaliação da estabilidade e segurança das suas estruturas, nos termos da Política Nacional de Segurança de Barragens – Lei 12.334/2010. Com um monitoramento cuidadoso, pode-se detectar fissuras e outros problemas na barragem, com a antecedência necessária para a adoção das providências corretivas);
  • Fiscalização (acompanhamento regular do empreendimento ou atividade pelo órgão ambiental e outros órgãos setorizados, como a Agência Nacional de Mineração, para que, em situação de perigo, sejam aplicadas medidas acautelatórias como o embargo de obra ou suspensão da atividade, e impostas ao empreendedor medidas emergenciais para conter a barragem ou, na pior das hipóteses, desocupar e isolar rapidamente a área em perigo).

Prevenção

Além disso, pode-se contribuir para a prevenção repensando o próprio sistema de barragem utilizado pelas empreendedores, pois, a depender das suas fragilidades, modelos mais propensos a acidentes devem ser substituídos por modelos modernos e com menor risco – justamente o que tentou fazer o Estado de Minas Gerais ao proibir novas barragens de contenção de rejeitos com o método de alteamento para montante, usado nas barragens rompidas em Mariana e Brumadinho (Decreto estadual/MG 46.993/2016), considerado por muitos engenheiros como obsoleto e inseguro.

“A prevenção pode custar caro. Mas é um custo que se justifica pela nobreza de sua função: preservar a vida e manter o meio ambiente equilibrado e sadio (sem o que não há qualidade de vida). Em nome de tais valores, as empresas podem e devem lidar com uma margem menor de lucro; seus acionistas podem e devem esperar um valor menor de dividendos; seus executivos podem e devem conformar suas expectativas a bonificações menos generosas. Lucros, dividendos e bonificações são interesses privados legítimos mas não podem ser atendidos em prejuízo dos interesses da coletividade”, ressalta Bechara.

O Brasil precisa, urgentemente, substituir a cultura da lamentação pela da prevenção. Nos acostumamos a simplesmente lamentar as tragédias e pouco temos feito para preveni-las. Na madrugada desta sexta-feira, moradores de outras duas cidades mineiras (Barão de Cocais e de Itatiaiuçu) tiveram de deixar suas casas, abruptamente, devido a riscos de rompimentos de barragens da Vale (Gongo Soco) e da ArcelorMittal (Mina de Serra Azul). É assustadora a dificuldade que o País tem de aprender com os erros.

Nesse sentido, o Direito Ambiental atua como uma ferramenta de fundamental importância para a sociedade.

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